O Ouvidor-Geral da Defensoria Pública do Estado do Piauí e diretor de Assuntos Parlamentares do Conselho Nacional de Ouvidorias das Defensorias (CNODP), Djan Moreira, participou, em formato virtual, do lançamento do Observatório que irá investigar a violação sistemática de direitos das crianças e adolescentes por operações policiais nas favelas e comunidades do Brasil. A investigação é resultado de denúncia feita no ano de 2021, através do Protocolo Facultativo relativo aos Procedimentos de Comunicação (Protocolo nº 3), que permite que organizações e indivíduos apresentem comunicação de denúncias de violações do Estado Brasileiro contra direitos previstos na Convenção sobre os Direitos da Criança (CDC).
A denúncia feita por entidades da sociedade civil relata a realidade de crianças e adolescentes das favelas e comunidades que sofrem com as sistemáticas e violentas operações policiais, transformando esses territórios em ambientes inseguros para o pleno gozo de direitos e desenvolvimento sadio das crianças e adolescentes atingidas direta ou indiretamente pelas incursões policiais. Essas operações violam diversos direitos previstos na Convenção dos Direitos da Criança, como o direito à vida, à dignidade humana, à convivência comunitária, à educação, ao lazer, bem como causando sérios malefícios à saúde mental.
Conforme consta na denúncia, apesar da ausência de informações por falta de preenchimentos nos dados oficiais, é possível constatar que no Brasil pelo menos 64% das vítimas da letalidade policial entre crianças e adolescentes são negras (pretas ou pardas). O Instituto de Segurança Pública do Estado Rio de Janeiro aponta que em 2019, 50,4% das vítimas por intervenção de agentes do estado entre 0 e 17 anos eram de cor parda, enquanto 30,6% dessas vítimas eram de cor preta.
Outro dado apresentado na denúncia trata sobre o Estudo realizado pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, que indica que entre 2017 e 2019 ao menos 2.215 crianças e adolescentes foram mortos por policiais no Brasil, com crescente porcentagem ao longo dos anos passando de 5% do total de mortes violentas nessa faixa etária em 2017 para 16% em 2019. O estudo supracitado aponta que foram considerados como crianças e adolescentes aqueles entre 0 e 19 anos e que alguns estados da federação não divulgam as idades das vítimas.
Também foram mencionados na denúncia os recorrentes fechamentos de escolas, postos de saúde, quadras de esportes, espaços de lazer e recreação durante as operações policiais, de forma a influenciar negativamente as condições necessárias para um desenvolvimento efetivo dos menores, resultando em um ambiente inseguro e inadequado para se viver, e que impede, crianças e adolescentes, de usufruir plenamente desses direitos.
O advogado do Movimento Nacional de Direitos Humanos (MNDH), uma das entidades da sociedade civil responsáveis pela denúncia, fala sobre o procedimento instaurado pelo Comitê dos Direitos das Crianças (CDC) da ONU.
“O lançamento do Observatório cumpriu um papel de ser a pedra fundamental para nós estabelecermos um plano de trabalho que alimente esta investigação que foi instaurada no Comitê de Direitos da Criança da ONU, através do protocolo número três, que apura a violência sistêmica contra crianças e adolescentes nas favelas e comunidades. Essa é a primeira investigação que o Estado Brasileiro responde dessa natureza, e temos a oportunidade de levantar uma pauta que é fundamental e que requer a contribuição de todos da sociedade civil, e de várias dimensões, para que possamos ter da ONU um conjunto de recomendações que leve o Estado Brasileiro a reordenar essa prática e que possa preservar e proteger as nossa crianças nas favelas e comunidades”, argumenta.
Representando o Conselho Nacional de Ouvidorias das Defensorias Públicas, Djan Moreira, Ouvidor Geral da Defensoria do Piauí destaca a importância do início das investigações.
“Considero muito importante essa denúncia, e essa investigação contra o Estado Brasileiro sobre violação de direitos das crianças e adolescentes por operações policiais. As nossas crianças e nossos adolescentes, todos os dias, sofrem as mais diversas formas de violência. O próprio Estado, além de não garantir as políticas públicas, como educação, cultura, saúde, lazer, ele vem com a bala, através dessas operações […] Coloco à disposição o Conselho Nacional de Ouvidorias de Defensoria Pública do Brasil, que reúne 15 ouvidorias de todas as regiões do Brasil e nós estamos à inteira disposição neste observatório. Embora seja triste a finalidade, parabenizo por ter homens e mulheres, como vocês, instituições importantes como estas, que realmente lutam todos os dias para que, especialmente, a Constituição Federal no seu artigo 227, o Estatuto da Criança e do Adolescente, Marco Legal da Primeira Infância, para que realmente sejam respeitadas”, concluiu.