A Defensoria Pública do Estado do Piauí, por iniciativa da 4ª Defensoria Pública do Sistema Prisional, em conjunto com a Coordenação do Sistema Prisional e o Núcleo de Direitos Humanos e Tutelas Coletivas, impetrou Habeas Corpus Coletivo junto ao Tribunal de Justiça do Estado do Piauí no sentido de que seja revisto o retorno de mais de 700 pessoas do regime semiaberto ao Sistema Prisional, mais especificamente à Colônia Agrícola Major César Oliveira, sem que antes seja apresentado um plano concernente às medidas adotas em relação à contenção da disseminação da Covid-19 naquele meio. O HC é acompanhado de 20 documentos que somam 475 páginas.
Para impetrar o Habeas Corpus a Defensoria buscou, em uma ação inédita no Piauí, a parceria de órgãos e entidades como a Ordem dos Advogados do Brasil Seccional Piauí, Coletivo Antônia, Flor, Rede Jurídica Pela Reforma da Política de Drogas, Instituto do Direito de Defesa Márcio Antonio Thomaz Bastos, entre outros.
Segundo a Defensora Pública Irani Albuquerque Brito, titular da 4ª Defensoria Pública do Sistema Prisional, a intenção é unir forças para evitar que mais de 700 pessoas retornem ao Sistema Prisional que até o presente momento não apresentou nenhum plano de organização para uma retomada segura, limitando-se a divulgar de forma genérica que possui capacidade para realizar 1000 testes, sem definir como serão feitos e nem apresentar um cronograma
A Defensora explica que na Colônia Agrícola Major César Oliveira, única no Piauí destinada ao cumprimento do regime semiaberto, há muito foi extrapolada a capacidade de internos que é de 290, sendo que antes da pandemia no local já se encontravam recolhidas mais de 600 pessoas, o que configura um grau inaceitável de aglomeração, comprometendo claramente as condições higienicossanitárias necessárias e recomendadas pelos Órgãos de Saúde para a contenção da Covid-19. No local ainda existe o agravante de que a estrutura física se encontra abalada, existindo inclusive documento comprobatório da Própria Secretaria de Justiça no Ministério Público, reconhecendo estas falhas e a interdição de pavilhões, o que contribui ainda mais para a superlotação.
“É importante que esse retorno só ocorra quando realmente o Sistema Prisional estiver em condições seguras de fazê-lo, da mesma forma que instituições, órgãos e até mesmo Município e Estado estão fazendo, com base em laudos e orientações emitidas por partes competentes, como o Conselho Regional de Medicina. Pelo cronograma divulgado pela Secretaria de Justiça a previsão é que esses internos, cerca de 700, retornem já no dia 01 de outubro e o que estamos pedindo é que esse retorno só ocorra quando houver de fato a apresentação do plano de retorno gradual e organizado, com base nas orientações sanitárias e médicas, visando evitar aglomerações, com a distribuição de EPIs em quantidade suficiente e periódica não só para os reeducandos, mas também para seus familiares que venham a visitá-los bem como para agentes e policiais que ali trabalham. O que pretendemos é evitar que todo um esforço efetivado no início da pandemia no sentido de conter a disseminação do Novo Coronavírus dentro do Sistema Prisional seja infrutífero”, diz Irani Albuquerque.
A Câmara Técnica de Infectologia do Conselho Regional de Medicina (CRM) procurada pela Defensoria Pública e parceiros, recomenda que o retorno das atividades na Penitenciária Major César ocorra somente após elaboração e implementação de plano de segurança detalhado contra a disseminação do Novo Coronavírus, afim de garantir a necessária segurança tantos dos detentos como dos funcionários.
O titular do Núcleo de Direitos Humanos destaca que o habeas Corpus representa também uma proteção para a sociedade em relação aos riscos de contágio. “Entendemos que, efetivamente, para esse retorno no mínimo se precisaria de um plano seguro por parte da Sejus e Avep, resguardando os direitos humanos, a vida e identidade dessas pessoas. Sabemos que o próprio ambiente do cárcere é inapropriado para as recomendações feitas pelos Órgãos de Saúde e entendemos também a necessidade de testagens, sendo que não foi fixado protocolo quanto isso. Também entendemos como muito arriscado esse retorno de todos em um mesmo dia. Como serão recebidas essas pessoas e em que isolamento irão ficar até o resultado da testagem? Então é um risco muito grande, enquanto que a prorrogação dos efeitos da portaria não causará maiores prejuízos, haja vista que desde o início da pandemia e do cumprimento da prisão domiciliar nenhum fato de extrema relevância diagnosticou o aumento da criminalidade. O que pretendemos com o Habeas Corpus é também uma proteção da sociedade, pois se tratam de pessoas que cumprem regime semiaberto, que podem se contaminar dentro da Penitenciária e levar o vírus para suas casas e para a comunidade em que residem. É preciso lembrar que, embora esteja sendo registrada redução no número de contágios e mortes, ainda estamos vivenciando uma pandemia”
A Defensora Irani Albuquerque diz que é grande a expectativa em relação a um retorno favorável ao Habeas Corpus. “Frente a essa grave realidade do Sistema Prisional resolvemos por essa ação em comum acordo com os parceiros , dialogando com a sociedade, especialmente com os setores ligados aos Direitos Humanos e acreditamos na sensibilidade , responsabilidade e coerência do Tribunal de Justiça do Estado do Piauí, no sentido de atender o nosso pleito e determinar o não retorno e a continuidade da prisão domiciliar em caráter excepcional no regime semiaberto até que seja cumprido o parecer do CRM, que é muito claro em sugerir que o retorno só seja autorizado após a apresentação desse plano seguro por parte da Secretaria”, afirma Irani Albuquerque.
A Coordenadora do Sistema Prisional, Viviane Setúbal, ratifica a posição da Defensoria. “Diante da ainda ocorrente pandemia do Coronavírus, que já tirou a vida de milhões de pessoas no mundo e no Piauí de mais de duas mil pessoas, a Defensoria Publica em razão do iminente retorno(em 01/10/2020) de um número considerável de Internos para o Sistema Prisional que estão ainda em prisão domiciliar e eventuais benefícios que correspondem à saída do estabelecimento e não conhecimento das medidas de segurança adequadas para evitar contaminação, objetivando resguardo da saúde e integridade de Internos, familiares e policiais penais, decidiu por manejar instrumento provocando o Judiciário a conhecer a matéria e decidir. Acreditamos na sensibilidade e postura independente e realizadora da Justiça.”