
“Ei, não derrube essas palmeiras. Ei, nos devolve os palmeirais! Tu já sabes que não pode derrubar, precisamos preservar a riqueza natural…” A reivindicação entoada com música é o clamor das quebradeiras de coco babaçu do Maranhão, Pará, Piauí e Tocantins, que estão reunidas em Imperatriz (MA), para discutir justiça climática, ambiental e de gênero. Trata-se da etapa regional do projeto “Defensorias nos Babaçuais – Acesso à Justiça e Defesa dos Direitos das Mulheres Quebradeiras de Coco”, com atividades que tiveram início hoje, 16, na Universidade Estadual da Região Tocantina do Maranhão (Uemasul), seguindo até amanhã, 17.
De iniciativa da Defensoria Pública do Estado do Tocantins (DPE-TO), por meio do Núcleo Especializado de Defensoria Pública Agrária e Ambiental (DPagra), o Projeto é realizado conjuntamente com as Defensorias Públicas dos Estados do Piauí (DPE-PI), Maranhão (DPE-MA) e Pará (DPE-PA); e pelo Movimento Interestadual das Quebradeiras de Coco Babaçu (MIQCB). A programação desta etapa regional conta com mesas redondas, tendas temáticas, finalizando nesta sexta-feira, 17, com plenária final e elaboração de documento pré-COP30.
Idealizadora do Projeto, a coordenadora do Núcleo Especializado de Defensoria Pública Agrária e Ambiental (DPagra) da DPE-TO, defensora pública Kênia Martins, explica que a etapa regional é ponto culminante do “Defensorias nos Babaçuais”, incluindo atividades e debates relacionados à 30ª Conferência das Organização das Nações Unidas (ONU) sobre as mudanças climáticas, a COP 30, que será realizada em Belém (PA) no próximo mês. “O atendimento das quatro Defensorias Públicas é um marco nessa aproximação entre as Defensorias e o MIQCB. E o que se espera a partir disso é que haja um entendimento entre o movimento e a Defensoria Pública no sentido de se traçarem estratégias de litigância e relacionadas às bandeiras do movimento, litigância por justiça climática, litigância por justiça territorial e ambiental”, disse a Defensora Pública.
A defensora pública Karla Andrade, coordenadora das Defensorias Regionais da DPE-PI, por sua vez, destacou a necessidade do Projeto nos territórios: “Eu aprendi com as quebradeiras de coco babaçu do Piauí, mulheres protagonistas, fortíssimas e que sabem das suas lutas e lutam. Já lutavam desde sempre contra todas as forças institucionais e mesmo sabendo de todos esses obstáculos elas estão lá, e todos os direitos que foram conquistas hoje, para as quebradeiras de coco babaçu do Piauí, foram fruto da luta. E a Defensoria Pública está do lado da luta, é quem está na rua, na escuta. Defensoria é de ação, não é de portas fechadas que atrapalham a realização de direitos. Nós que estamos aqui estamos sabendo da nossa responsabilidade”, ressaltou.
“É um trabalho que envolve quatro Defensorias Públicas, revelando a unidade da Defensoria Pública no Brasil. As linhas que dividem nossos estados são imaginárias, afinal de contas, o trabalho que tem que ser feito a todas essas comunidades não pode encontrar empecilho de ordem administrativa. A Defensoria Pública brasileira conseguiu entender bem essa mensagem, conseguiu se unir, mostrar sua unidade e o seu respeito para com as quebradeiras de coco babaçu e, com essa missão, que é promover justiça de gênero e justiça climática, a gente dá um grande passo na defesa de direitos humanos e do próprio bem-viver dessas comunidades tradicionais das florestas de babaçuais que envolvem nossos quatro estados˜, disse o defensor público geral do Estado do Tocantins, Pedro Alexandre Conceição Aires Gonçalves, presente nas atividades.
Defensor público geral do Estado do Maranhão, Gabriel Santana Furtado Soares também participou do primeiro dia de atividades da etapa regional do Projeto e destacou a importância de as Defensorias Públicas irem até a essas mulheres e proporcionar esse espaço de escuta: “Tem problemas que você só identifica falando com elas [mulheres quebradeiras de coco babaçu], que são as donas da dor. Tem dores que você, no seu gabinete, que a letra da Lei não mostra. Questões como, por exemplo, do agrotóxico, da violência, do preconceito, você tem que ouvir delas e sentir com elas isso. E esse é o papel da gente hoje, nesse Projeto, ouvir e ver o que é prioridade para elas, e a partir daí, o que é prioridade para a Defensoria Pública.”
O defensor público do Estado do Pará, David Oliveira Pereira da Silva, disse que essa integração com os outros três estados mostra a organização de um movimento que precisa ser valorizado e mais reconhecido. “Espero que daqui tenha encaminhamentos que possam, de fato, valorizar cada vez mais essa comunidade extrativista organizada. A Defensoria Pública é um órgão de transformação social, então nada mais justo do que valorizar, receber essas mulheres e tentar fazer com que elas sejam mais enxergadas.”
A vice coordenadora-geral do MIQCB, Ednalva Ribeiro, destacou a importância do espaço de escuta proporcionado por meio do Projeto: “Esse espaço que a gente está fazendo junto com a Defensoria Pública é de grande importância, porque a gente já estava cansada de falar pra nós ‘mesmo’. Esse projeto é uma forma da Defensoria Pública nos ouvir, entender nossas reivindicações, nos ajudar a combater as violências que estão acontecendo nos quatro estados, principalmente a questão da derrubada do babaçu, do envenenamento do babaçu. E essa atividade eu espero que tenha muito êxito, (…) não é só a questão de reivindicar, mas queremos ser ouvidas, queremos ser atendidas. Por isso é muito importante estar nessa atividade com a Defensoria Pública.”
A abertura das atividades da etapa regional contou com a presença de diversas autoridades. Para a secretária executiva do Ministério das Mulheres, Eutália Barbosa Rodrigues Naves, o “Defensorias nos Babaçuais” é uma reparação histórica a essas mulheres. “Primeiro porque as mulheres quebradeiras de coco trazem para nós um exemplo de proteção da vida, de proteção do meio ambiente, sobretudo nessa conjuntura, nesse momento em que o mundo discute a questão das emergências climáticas. A gente fazer um evento desses, que amplia o acesso a direitos, eu acho que é uma questão mesmo de reparação histórica de quem já ensina há muitos anos como lidar com o meio ambiente e garantir o bem-viver no mundo e especialmente nessa região.”
Carta COP30
Já no primeiro dia de atividades da etapa regional, foi entregue aos integrantes da mesa de autoridades uma cópia da Carta da Pré-COP dos Povos e Comunidades Tradicionais.
“Estamos aqui porque somos capazes de planejar leis e defender os nossos direitos. Estou aqui com a consciência de que esse modo de vida natural é o que traz a proteção a essa natureza, ao que é de Deus. E como diz o Hino Nacional: somos grandes pela nossa natureza, somos grandes pelos povos tradicionais, pelos quilombolas, pelos indígenas, pelas quebradeiras”, pontuou Valéria Maria, quebradeira de coco babaçu do Pará, que falou em nome das mulheres presentes.
Trabalho interinstitucional
O “Defensorias nos Babaçuais” conta com a parceria do Governo Federal por meio do Ministério das Mulheres e do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima, por meio da Secretaria Nacional de Povos e Comunidades Tradicionais e Desenvolvimento Rural Sustentável. Conta, ainda, com a parceria do Conselho Nacional de Defensoras e Defensores Públicos Gerais (Condege).
Fonte: Comunicação DPE-TO – com adaptações